sexta-feira, novembro 30, 2007

Caminho para a liberdade!

22h17

Tá tá tá… ploc..ploc…. Silêncio..tá, tá, tá, ploc, ploc! “Seu filho da puta!” Tá, tá, tá…
“Seu filho da puta”….
“Baleado, baleado, tem um cara baleado”….

“Agora mesmo!”
….
“Vem logo!”
E ele continuava a gritar, desesperado. A voz tremia. Reacção seca, ao instante. Não era ele, deitado no chão. Era outro que não teve tempo de gritar. Não se sabe se resistira. Assalto. Só se ouvira o baque seco, segundos antes. Ali em frente ao ponto de táxis. Mas não tinha táxis naquele instante. Do lado da padaria, fechada! Ninguém passava. Só aquele que gritara. E chamara a polícia. Mas ele era da polícia. Silêncio.

22h17.
Vidraças que deslizavam nas varandas, nas janelas; para ver acontecer. Ele apagou a luz. Abriu a vidraça. Um som novo, que não fazia parte do seu quotidiano – esse o das balas. Até podia não ser! Até ouvir:”baleado”!

22h18
Muitos corriam em direcção ao ponto que se via, no alto do quinto andar. Ali mesmo naquela rua, antes do cruzamento com a outra. Sempre uma, e outra! Minutos depois, como ratos que fogem do fogo, carros de polícia aceleravam na rua, como tunnings… Motos ultrapassavam as viaturas que estavam agora barradas naquela via. A do crime, ou da normalidade de uma cidade assim, de extremos. É que a linha que divide a normalidade da anormalidade é muito ténue. E o tempo é mais célere, como se tudo pudesse acontecer no mesmo instante.

22h19
Ligou ao porteiro. O que se passara?
“Está tudo bem”?
“Pelo que ouvi senhor, parece que houve um assalto aqui do lado”.
“E os tiros”?
“Não sei senhor, parece que balearam alguém. Agora o que aconteceu ao certo eu não sei. O que importa é que com a gente está tudo bem, graças a deus”!
Até parecia. Todos olhavam a cena do alto dos andares. Até parecia estar tudo bem com os que olhavam de cima.

22h20
Estudantes passavam e olhavam para trás. Ficaram parados. Olharam de novo. Nervosismo inculcado. Ainda atordoados entre o que pode ser real ou ficção.
O Bomboa também parou. Em segundos, homens saíram lá de dentro. Queriam ver o que se passara. A rua engarrafou por minutos. A impaciência fez as buzinas gritarem, estridentes, redundantes, irritantes. Com o corpo imóvel.
E agora só se vêem luzes vermelhas a piscar. Onde estão estas luzes só há duas hipóteses: já aconteceu ou ainda vai acontecer.

22h21
Nestes instantes nenhuma ambulância chegou. Não chegou… a chegar! Apenas os ratos atarefados na intervenção. O estigma da massa. Tanta polícia… para nada. A chegada não é prevenção. Aparato!
As luzes piscantes desapareceram. O estacionamento das motos, alinhadas em espinha, dispersou. Aceleraram noutra direcção. A poça de sangue lá ficou, no escuro, entre as árvores. Não se via. Mas sentia-se o cheiro de sangue. Se ficcionada ou real, melhor é nem querer saber. Não se quer, como os outros. “Viver assim é foda”, diz-se!
E por momentos pararam as suas vidas: 22h22.
O homem fugiu. O polícia seguiu!
“Aí quando o cara puxou da arma, policial não teve outra. Matou o cara!”
22h23

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