sábado, julho 11, 2009

Já não se cedem casacos, nem se carregam livros até casa. Por onde andam os papeizinhos?

E agora vêm as feministas acusar-me de submissão pelo título. Que venham! Não me interessa. Lembrei-me dos papeizinhos na sala de aula. Lembram-se? Aquelas folhas amarfanhadas: “Queres namorar comigo? Sim, Não ou talvez?”. Isso quando o talvez ainda significava que a miúda até poderia mudar de ideias e isso inflamava o coração (do miúdo) de esperança. Claro: as miúdas que o ousassem fazer eram ATREVIDAS: logo ali marcadas por todas como oferecidas. Hoje, quando muito, o pedido nem vem: curte-se- (será que essa palavra ainda existe, actualizem-me , por favor) na esquina (e eu até gosto de esquinas, são viés do mundo) e, no dia seguinte, não se sabe muito bem se realmente aconteceu e se devemos ou não aproximarmo-nos para perceber: então, namoramos ou não? Na melhor das hipóteses formaliza-se a coisa por mensagem, hi5, orkut, e-mail, e outras estratégias não-comunicação (O que se partilha afinal nesses-divãs-ilusórios-de-amizade que nos põem todos a viver uma esquizofrenia da possibilidade invisível, a angustiar para que “talvez” aconteça).

Percebi, assim devagarinho. Mas continuo a gostar dos papeizinhos. Não que tivesse recebido muitos. Lembro-me que não, talvez dois ou três no histórico. Vinham cheios de corações, de lápis de cor, canetas de filtro (sim, lembro desse) e com aromas de chiclete, ou arrancados do caderno: o que dizia algo sobre a personalidade do interessado: mais “nerd”-marrão, certo?-, sensível, ou assim, à bruta. Miúdo que arranca a folha do caderno, com certeza, é prático, bruto, sem meias-medidas, mas ok ainda usa o velho método, porque é tímido para falar com ela, comigo, seria? De resto, só me lembro que não tinha, depois, muita paciência para os miúdos da classe: um bando de putos, claro está - como se eu fosse, muito grande. Alta sim, para a idade, mas com as mesmas carências que uma miúda de 10 anos tem, quer, sente, pede - assim baixinho para que não ouçam demais e se saiba (acho que o primeiro bilhete veio nessa altura e eu não me achava assim tão criança – era a maior, pensava, e queria já ser tratada como uma mulherzinha, se faz favor).

Ok que as circunstâncias obrigaram a “crescer” mais cedo, (mas havia alguma coisa de cada-coisa-no-seu-tempo que eu achava aquém). E depois, claro, lembro que sempre tive o complexo da altura; do corpo que veio antes do tempo (Afinal não mudaste muito desde os teus 15 anos, dizem.). E tudo era muito mais ponderado. Talvez por isso, tinha o terrível vício de me apaixonar (ou achar: porque a paixão não se percebe bem o que é, naquela idade – ou nesta – apenas que é intenso e verdadeiro e absoluto para nós) por rapazes que além de inalcançáveis, platónicos, eram sempre os bonitões mais velhos: o que, naquela idade, claro está, significa sofrimento a triplicar. Ok: nunca na vida ele vai olhar para mim. Óculos ovais, magrela-atlética e claro um misto de nerd com Maria- rapaz. “Vês como consigo subir a esta árvore; vês como ando bem de bike; vês como corro mais rápido que tu; vês como ganho ao braço de ferro”. (Que chata! – e não tenho bem a certeza se isso terá mudado muito).

Bem vistas as coisas: nunca na vida alcançaria a atenção deles: até porque não queriam alguém que corresse mais rápido que eles, ou ganhasse ao braço-de-ferro. Óbvio. Mas nunca pensei mudar de estratégia. A questão é que eram sempre inalcançáveis. Depois até consegui um bonitão ou outro mais velho, sem papeizinhos, na realidade, mas logo percebi que eles não eram para mim. Eles têm um grave problema com as miúdas. Ou seja, estão sempre rodeadas de miúdas. Ih. Quando a coisa é muito concorrida, gosto de ser do contra. Perco o interesse. Sim, ok: com baba e ranho, e parece-que-o-mundo-vai-acabar. Lembro-me de um bonitão (era-o, na altura: vi-o há pouco tempo e realmente não percebo o que nós víamos nele) que me disse: “Só não namoro contigo porque não és loira”. Ok, o rapaz tinha um fetiche por elas. Na altura, aquilo doeu: hum, se doeu! E não percebemos o alcance do que realmente significa. As nossas preocupações eram outras.

Hoje, lembro-me disso e não consigo deixar de rir. Gargalhar. E Gargalhar de novo. Tem a sua piada. Mas ele até era bom rapaz. Passei dias de detective a tentar descobrir o número de telefone de casa dele (Lembram-se? Não havia internet, nem e-mail, nem msn, nem hi5, nem facebook, nem telemóvel.) A via-sacra era portanto mais penosa, difícil e quase-inalcançável. Folheei a Lista Telefónica, página a página para encontrar o último nome da família: só sabia isso e o nome da rua. Vá lá, quem não o fez? Só consegui ligar uma vez: na hora H, tive um ataque de mudez: lembro que estarreci, congelei, eu sei lá. No dia seguinte sonhei com um papelzinho que nunca chegou. A história passou num ano lectivo. Até que veio aquele. Outro inalcançável que afinal até cheguei lá, num bate-e-volta de três anos.

Chegava as férias de Verão e: plofff! A malta desencontrava-se. Cada um para seu canto. Não havia a maturidade e percepção de dar continuidade: férias de Verão significava, simplesmente, caminhos diferentes. E esse não veio com papelzinho. Mas era intenso. Hoje percebo que era mais importante do que a distância que lhe dávamos: ou por insegurança, ou por me achar menos merecedora e envergonhada por, afinal, ele ser três anos mais velho, e não ser visto com uma miúda – sobretudo essa que ganhava os corta-mato todos da escola. Uma vergonha, achava eu. Melhor manter assim a distância. Depois, no meio de crise – sim porque nós também temos crises aos 13 anos – veio o das férias (5 anos mais velho, lindo!) e outro popular lá da escola logo de arranque no ano lectivo. Para mim tudo muito ponderado. Para ele uma seca. Era certinha depois, só pode!

Encontrei-o: está careca e tem dois filhos. A mulher veio logo ver com quem ele estava a conversar no meio de um shopping: “É uma amiga que não vejo há muito tempo”- lindo, de novo!) Mas claro, naquela época, já estava timbrada como a ex do gato-sucesso-da-escola. Veio, depois, o mesmo – o dos três anos, lembram-se? - e ok, a paixão e o encantamento de novo. Mais uma colheita no ano seguinte e pluff: sai-me outro bonitão na rifa (tinha mesmo a mania, mas com todos tive o mesmo problema: ou seja eles tinham um problema com as miúdas). Esse até hoje ficou-me atravessado. Se fosse a atrevida, teria, quem sabe, mandado o papelzinho: pelo menos não ficaria com a dúvida. Adivinhem o que vem a seguir: isso mesmo! Mais um para o histórico. Veio com um quase-papelzinho e durou 5 anos e meio. Do resto não falo, porque não é da época dos papeizinhos. Entrou na era telemóvel e, com ele os papeizinhos: em formato de extracto da conta do fim do mês. Eis-los! (E acho que o meu pai na altura, depois disto, não se importaria que os papeizinhos, também, tivesse vindo, em vez da conta do telefone).

Sem comentários: