segunda-feira, julho 12, 2010

O novelo

Avó, quando for como tu, se mo deixarem ser, de cabelos brancos serenos, posso passar as tardes a enrolar novelos, depois das meias que coseste para os netos, para que não tenham os pés frios de Inverno? Posso comer chocolates com queijo, depois do verde tinto do almoço, ainda que não goste muito, e as bolachas de canela que guardas para os netos? Posso comê-las todas? Posso meter-me a plantar couves com a parcimónia de as ver dar tenras e viçosas para a sopa com feijão? Ver os coelhos crescer ao lado das galinhas sem preocupações de maior, porque já criaste os filhos, viste-os ter outros filhos e ralhas-lhes como se fossem teus rebentos em construção de vida? Posso fazer tudo isso? Posso ter um novelo igual ao teu: desses chorudos e fofos cor-de-rosa? Diz-me que sim, mesmo mentindo-me e eu sabendo que não, porque arranquei demasiados fios de lã do meu, ainda ele ainda ia a meio. Quase não me resta nada e ainda falta muito para chegar aos teus cabelos brancos. Nunca terei um novelo como o teu. Disseste-me que a linha velha tinha de ser arrancada, como as coisas más da vida. Acho que que já não se fazem novelos como antigamente, nesse teu tempo. Dás-me outro? Posso recomeçar tudo de novo?

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