quinta-feira, janeiro 26, 2012

Hilda, a fofa blasé

Há quem já lhe tenha pedido workshops, se candidate para ser aluna para toda a vida, seguidora, fã incondicional, ou ainda mesmo a tenha convidado a escrever um livro sobre essa arte de ser, assim, uma fofa blasé. E ser fofa blasé é todo um mundo fisiológico, porque, dirá ela, isto não se aprende, ou ensina, nem será coisa dignificante de um manual de instruções, ou sequer guia rápido de consulta na carteira, porque, em rigor, ela percebeu que isso, existindo, só pode ser modo de estar, ser, haver e por aí fora, quanta geografia por galgar em todos os verbos auxiliares, exercitando, com arte e manha temperada, ora doce, ora acre, só um pouquinho. Porém, sê-lo assim, percebemo-lo em Hilda, pode ter, de fato, um amargo maior.

Hilda é essa fofa blasé. 

Uma espécie de diplomacia nos afetos, ora dá, seduz, ora, de repente, não se compromete com nada, nem ninguém, como que deixando, isso, um leve perfume no ar que eles hão-de sentir e querer agarrar, tal qual o último fôlego, a última réstia de esperança, como a bruxuleante luz de vela, quase a esmaecer, mas ainda não se indo, rodopiando no etéreo momento que resta, dando o seu melhor brilho.

E a ser verdade, que ela, Hilda, a nossa Hilda, seja uma fofa blasé, conforme lhe chamou B. - enternecedora e fiel a amiga, de banhos de mar, sol de Ipanema, e corpo dourado no Leblon, e ainda chope e samba na Lapa a altas horas, antes do nascer do dia para o café da manhã - ela terá razões para melhor perceber porque assim não o é, quando submetida ao mais genuíno e traiçoeiro dos afetos. 

Em vez de usar o blasé, cogitou, como antídoto para esse certo veneno, destilado em doses acima do suportável no início, e depois quase como último fôlego de vela, num vazio eco do vidro da poção, ela passa a ser, pois, a fofa incondicional. E, sabemos, sê-lo, nunca trouxe coisa boa. 

Porque toda a lógica do que ela nos disse, perde fundamento: "os caras ligam e você não dá bola; o cara convida e você diz que naquele dia não dá, ou que pode ser", desvalorizando, "que está ocupada, que está trabalhando, que é melhor deixar para outro dia, que não atende, que depois, se rolar, vocês se encontram e tal". É que aí percebemos como funciona a natureza da mente: quanto mais você dá para trás, e nem se fazendo de difícil, apenas porque você nem está a fim,  mais eles ficam circundando a área, como feras amansadas. Por isso, a gente sempre falou "Hilda e os seus homens", quase ansiando encontrar com ela para saber uma história nova. 

Ela tinha sempre uma história nova. 

Nos últimos tempos, todavia, ela meio que se reformou, inconscientemente, porque passou a ser a fofa incondicional, em prol, vá lá, de pelo menos dois deles. E ter dois homens, Hilda a dois, não é, convenhamos, nada normal. É, por isso, anda "meio dividida", me confidenciou. Mas dividida, porque, no final das contas, nenhum deles é exatamente aquilo que ela precisa, como complemento de vida, assim, parceiros, cúmplices do óbvio. 
Anda tudo errado, a gente falou para ela. Ela meio que anuiu, mas não se deixou convencer. Lembrou até dessa história da idade e assim. Eu juro que nunca ouvi a Hilda falar da idade, nem dessas filosofias de auto-ajuda e blá, o tempo que passa, os núcleos fortes como fases de vida. (Hilda, relaxa e goza!, vai!)

Ela anda com um discurso meio estranho. Houve até um momento que ela lembrou um cara que no segundo encontro de ida ao cinema - puro encontro de amigos- ela ficou meio assustada, percebendo o efeito que poderia ter o fofa blasé: o cara virou para ela, um cara estabelecido, seus 42 anos, filha de 14 anos, meio feiinho, mas super interessante, amigão: "-Tá na hora de você se estabelecer, casar, quem sabe ter filhos. Tem que procurar companheiro. Você não gostaria de ter filhos? Quero dizer para você que estou disponível". 
A Hilda saiu correndo do carro, nem deu xau e nunca mais falou com o cara. É como se a distribuição dos afetos estivesse mesmo desequilibrada. Nessa hora, lembro bem, B. falou: - Puxa, Hilda, quem dera que isso acontecesse comigo! 
Eu falei para elas que era melhor acabar com esse negócio de fofa blasé,  pois a conversa estava a ficar séria demais, e aos 25, ainda não é tempo de ter conversas sérias, quando tem um sol chamando na rua. 

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